desenredo, subst.
masculino -
ação ou efeito de
desenredar (-se);
      * * * * * * DESENREDO * * * * * *      
Site idealizado por José Carlos Corrêa Cavalcanti (2005)
desenredamento;
desprender-se da rede;
separar-se do que
está enredado.

O Monge e o Dragão

O dragão não é para ser deletado. Ele é necessário! Sem o dragão não haveria iluminação, isto é reconhecimento de nossa natureza última.

Como pode ser isso? o dragão não é aquilo que nos separa da Paz?

Quando as aflições e outros sofrimentos psicológicos nos atormentam, as condições exteriores são apenas o gatilho.
Qualquer perturbação exterior é interpretada pelo pensamento e ativa a instabilidade intrínseca
do processo emocional, gerando temores e ansiedades, mas nunca a tão desejada Paz — porque esta surge tão
somente ao sossegar do oceano tempestuoso que são as emoções e preocupações.

Não será por isso que Jesus disse: "Meu reino não é deste mundo"?

Mas é próprio do ser humano, desde tempos imemoriais, apelar a um poder superior em suas aflições.
Vejamos alguns trechos do belo Salmo 34, de Davi:

Busquei ao Senhor, e ele me respondeu; livrou-me de todos os meus temores.
Clamou este pobre, e o Senhor o ouviu, e o salvou de todas as suas angústias.


Os versículos mostrados mostram claramente duas coisas:

1) que é nosso mecanismo mental que gera o medo, a angústia, a ansiedade e todo o tormento de existir;
2) que há uma força superior a esse mecanismo perante a qual ele se desativa,
ficando em seu lugar o sentimento de bem-aventurança em nossa alma.


Quando Davi diz "este pobre", está aludindo a seu "eu", sem dúvida; pobre, porque sem recursos
para fazer cessar o tormento interno causado pela mente, ou seja, calar o dragão.
Porque a mente é o dragão atormentador, feito de emoções, sensações e pensamentos.
Esses fatores, estimulados pelas condições, fogem ao controle do nosso "eu".

Temos portanto, de um lado, o "eu", e de outro, o dragão.

Mas o que é, em última instância, o "eu"? Já pensou nisso?

Com certeza, não é o conjunto das emoções, sensações e pensamentos,
que falham ao responder pelo principal fenômeno dos seres vivos: ser consciente, ouvir um som,
saborear uma comida, etc. — a menos que você aceite que é o cérebro que o faz.


Pense nisso: quando você fica consciente de um forte ruído, por exemplo, não é o pensamento,
nem a emoção nem a sensação que ficou consciente
, embora essas coisas surjam logo em seguida.
      — o pensamento tentará dizer do que se trata;
      — uma sensação física de agrado ou desagrado surgirá automaticamente;
      — e, talvez, alguma emoção seja despertada (medo por exemplo).


Mas, com certeza, não é o pensamento que ouve o barulho; nem tampouco a sensação ou a a emoção.
O que é ISTO QUE FICA CONSCIENTE, então?

Antes de dizer que é o cérebro, lembre-se do girassol, que gira delicadamente na direção da luz solar;
ou pesquise na Internet sobre plantas carnívoras, como a dioneia e a drósera spatulata, que não possuem cérebro
mas SABEM quando apanham uma presa, assim como também demonstram extraordinária
inteligência quando da montagem de suas armadilhas.

De novo: o que é, então, ISTO QUE É CONSCIENTE?

E´ o SER que há em nós (e em tudo), e que se revela como Consciência Pura.
Nós não podemos conhecê-lo, como se fosse algo exterior a nós.
Mas podemos ser o SER, o que vem a ser a autêntica conversão religiosa.

Esta, entretanto, é raríssima, pois não nos oferece nenhum ganho no mundo material.

Como assim, podemos ser o SER? então já não O somos?

Sim, somos — mas não sabemos disso! e por quê? Acontece que Ele se encontra recoberto pela memória, pelas descrições
e imagens das coisas do mundo, às quais nos apegamos, ou aborrecemos imensamente.

É como uma grande luz recoberta por uma fina tela, onde está projetada toda sorte de imagens da experiência humana,
desde as sabedorias mais elevadas e as imagens sacras mais sublimes até as mais devassas representações
de todo tipo de depravação e vícios — e também todos os terrores e ansiedades que assolam a humanidade.

E nossa atenção encontra-se hipnotizada exatamente por essas imagens, que refletem a experiência humana ao longo dos milênios.

Essa mistura de memória e atenção gera o eu separado (na mitologia judaico-cristã,
chama-se Lúcifer, o "Portador da Luz", o anjo caído). Esse "eu", ou "ego", torna-se, assim, o grande obstáculo.

Mas é também aquele que, compreendendo a si mesmo, poderá desvestir-se das roupagens do engano,
adquiridos em muitas existências; e, em sua nudez, reconhecer sua real Origem.


Quando o ego quer procurar a realidade transcendente (Deus) para ter saúde e bem-estar material,
o que o move é seu viés utilitarista, de interesse estritamente pessoal.

Melhor seria descobrir-se como um grande engodo cósmico e despir-se de suas máscaras!

O que é necessário é morrer para sua falsidade e fazer uma
intercessão sincera para que lhe seja retirado o véu que oculta a Realidade de onde veio.
 

Agora, olhem para a imagem do lado direito: o que o dragão tem sob suas garras? Uma pérola! Uma "pérola de grande valor".
Estará o espírito do Mongezinho prisioneiro do dragão?

Mesmo os mais bem intencionados podem estar laborando em erro: talvez ainda sejam uma das infinitas faces do Portador da Luz.
Uma face contrita, sofrida, pois, ao meditar, ao orar, ao tentar se elevar, eles têm o espírito aprisionado pelo dragão.

Sua devoção está sendo sabotada! Por isso estão sempre em dúvida; por isso não conseguem morrer para si mesmos.
Ainda estão sob o véu que esconde a Realidade.

O Espírito, que é Consciência Pura, jamais é aprisionado
mas nossa ATENÇÃO, que é uma emanação do Espírito, essa SIM, está presa pelo dragão da mente.

Aprisionada, nossa atenção está sempre se projetando para fora, totalmente governada
pelas emoções, sensações e pensamentos, instrumentos do corpo para satisfação do prazer e fuga da dor.
Porém, esses instrumentos não têm poder em si mesmos: eles precisam de um eu-pensamento,
coisa que os animais não possuem, por isso não guardam raiva e a premeditação de seus atos é de pequeno alcance.


O surgimento do eu pessoal é necessária mas crítica da longa noite da evolução humana.

A ideia de um pensador externo aos pensamentos é a base do eu pessoal; mas esse pensador É, ELE PRÓPRIO,
UM PENSAMENTO! Não existe tal suposta entidade exterior aos pensamentos!
Ao aceitar sua existência estamos recriando o PORTADOR DA LUZ, e isso é o coroamento da
MEMÓRIA mesclada à atenção, que é A FAGULHA DO DIVINO em todas as formas vivas.

Mas a evolução não pode se deter nesse ponto; isso está levando os seres humanos
à bestificação diante da tecnologia, que haverá de substituí-lo,
sem falar no emaranhado emocional que continua a dominar o pensamento e engendrar o ego,
o Portador da Luz — gerando crueldades e absurdos a que parecemos estar habituados,
e levando o planeta à destruição.


A questão que se coloca, então, é: como libertar a atenção/espírito das garras do dragão?
Sim, pois nossa atenção está refém do pensamento, sensação e emoção.
Escrava do pensamento, continuamente ela se projeta para fora, em busca não somente de
subsistência mas também de prazeres, fuga do sofrimento, e busca de sentido para a vida.

Para isso ocorrer, PRIMEIRO DE TUDO TEM QUE HAVER UM CHAMADO, que desperta o INTERESSE.
E uma grande força interior, pois quem entra nessse caminho é rejeitado pelo mundo.
Grandes sofrimentos deverão ser enfrentados.

Mas talvez o sofrimento sozinho não seja suficiente.

Penso que uma combinação de SOFRIMENTO, DEVOÇÃO E ESCLARECIMENTO
é o caminho da redenção do ser humano moderno, mais escravizado e ignorante do que nunca.

Sempre houve, embora raríssimos, aqueles de sabedoria espontânea e natural devoção à Luz do Universo,
e até mesmo identificados com ela, como Jesus, Buda, J. Krishnamurti e outros.
E também aqueles, igualmente raros, que foram transformados para manter elevada comunhão com o Absoluto.

Penso que Davi teve o bastante para entregar seu caminho nas mãos de Deus:
"Entrega o teu caminho ao Senhor; confia nele, e o mais ele fará." (Salmo 37:5).


Por isso pôde dizer:
"Clamou este pobre, e o Senhor o ouviu, e o salvou de todas as suas angústias"


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